quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Amo-te



Somos brindados pelo sol que aquece os nossos rostos enternecidos, no final de tarde que nos espera na praia erma, no anúncio do Outono que se aproxima mansamente na quietude dos meus dias.
É chegada a hora de experimentar o abandono do peso das desilusões para que o vento se encarregue de as apartar para bem longe.
É chegada a hora de colher o que já amadureceu e deixar vingar as emoções que afloram a cada dia e de sorver o instante que traz a mais pura semente germinável, que me transforma ao sentir o seu toque suave.
É sob essas emoções que escutamos o lamurio das vagas que se agitam contra as rochas num capricho imparável, que nos apazigua a alma e interrompe o nosso silêncio. O seu rumor traz-me a tua respiração que me segreda ao ouvido, sem as interferências da mente, sem os pensamentos que me anulam.
A paz e a ternura que se espelham no nosso olhar, dizem sem palavras aquilo que sentimos.
Sinto o meu coração a dar tréguas quando estou envolta nos teus braços, ainda que as lágrimas brotem dos meus olhos. Já não são, porém, lágrimas de dor; são lágrimas que limpam a minha essência, que nascem pela emoção dos meus sentimentos.
Sentimentos… palavras para quê, quando sabemos o que sentimos, quando o silêncio do nosso olhar se incumbe de os expressar?
No meio de tantos sentimentos confusos que me assolaram, este acalma-me e sossega-me.
Quantas vezes pensei que amava, quando afinal o que me consumia era o fogo da paixão e a ânsia de ser amada… Sentia-me viva enquanto ardia… Morria lentamente quando se extinguia. Restava a palidez esculpida no meu rosto por mais uma desilusão que tomava conta de mim.
Gritava por auxílio a minha alma. Já quase não tinha forças para continuar a clamar e abandonei-me, deixando-me vencer pela dor lancinante que me tomava e pela desilusão que habitava no meu ser.
Quando apenas ecoava o apelo mudo na minha alma, surgiste docilmente com um sorriso nos lábios, um brilho nos olhos, com a promessa de me dar a paz que procurava, até quase me esgotar para seguir no seu encalço.
Cumpriste com a tua promessa, enquanto o meu sentimento por ti se multiplicava a cada dia que passava, a cada recordação do toque suave de uma rosa a percorrer a minha pele, a cada gosto dos beijos profundos, a cada perfume inalado, a cada carícia lembrada com ternura…
Vi os dias passarem e crescia em mim uma ânsia. Uma ânsia de ficar ao teu lado num local só nosso, onde os olhos mundanos não nos abrangessem, onde só a Natureza nos rodeasse e nos brindasse com os seus cheiros, os seus sons, a sua beleza inigualável. Desse local eu não queria partir…
É nesse local que me proteges e onde finalmente me sinto amada, onde nos olhamos e ficamos por vezes em silêncio, transparecendo nos nossos olhos aquilo que nos vai na alma.
No meio de tantas palavras, ainda tanto resta para dizer…
O sufoco que me aperta a garganta aumenta à medida que os ponteiros do relógio avançam apressadamente perseguindo a noite que prenuncia a despedida.
É sob o olhar terno das estrelas que se liberta dos meus lábios a palavra que traduz aquilo que sinto por ti, que cresce a cada momento que passamos ou mesmo quando estamos ausentes. Uma só palavra basta para expressar um sentimento tão nobre.
São por vezes as palavras mais simples que negamos pronunciar, pelo temor da derrota que nos invade o pensamento.
Desprendem-se dos nossos olhos lágrimas que banham os nossos rostos, misturando-se num abraço demorado que vem sustentar o que as nossas bocas proferiram.
Fica no ar o alívio por termos soltado o que julgávamos bastar aos nossos olhos dizer, sempre que os nossos olhares meigamente se cruzavam.
Melicamente escuto agora na minha lembrança, no aconchego do ninho que já nos acolheu, a palavra que faz transparecer o mais nobre dos sentimentos: AMO-TE…

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Saudade e Paz



É noite.
Cobre-me um manto de estrelas na praia deserta que já nos acolheu, enquanto se passeiam por mim os pensamentos nostálgicos que te trazem à minha lembrança. Adivinha-se a minha partida do local onde selámos o nosso encontro.Tudo me faz recordar de ti… a Lua que reflecte o seu encanto de prata sobre o mar, que sussurra os segredos que nem todos sabem entender, que me lembram o teu olhar que fita o meu com ternura, sem palavras pronunciarmos, mas dizendo tudo o que nos vai na alma; o brilho das estrelas que me lembram os teus beijos cheios de carinho; a areia fina e fria que me acolhe agora sozinha, sem a tua presença. Nela me aconchego e imagino os teus braços que me prendem no teu calor. Fecho os olhos e inalo o odor que traz até mim o teu cheiro, ouço o murmúrio das vagas que me traz a tua respiração…
Vives em mim.
Qualquer pensamento me leva até ti e sinto uma paz invadir o meu peito.
Transpiro música com o toque suave dos teus dedos sobre a minha pele.
Habitas em cada pedaço da minha existência.
Pertences-me sem me pertenceres…
Fazes parte da nova mulher que nasceu em mim.Sou flor que brota viçosa no jardim que começaste a cuidar. Alimentas-me a cada dia com o teu carinho, renovo-me a cada momento com as recordações que persistem no meu pensamento.
É com essas recordações que regresso ao meu leito que me espera uma vez mais vazio, caminhando placidamente entre o ruído e a pressa, lembrando-me da paz que reside no silêncio emanado dos nossos olhares.
Já não me sinto a vaguear solitária no meio da multidão, pois sei que mesmo ausente permaneces no meu coração, sem precisar de me renunciar para poder amar.As lágrimas que por vezes teimam em rolar pelo meu rosto, apenas me lembram as emoções e os sentimentos que residem em mim e que se espelham no nosso terno olhar.
Não sinto mais tristeza ao ouvir a chuva a cair. Escuto agora a sua suave melodia que canta na vidraça da minha janela que quer abrir-se de novo, para que eu possa sentir o vento soprar de mansinho e percorrer todo o meu corpo, renovando-me a cada passagem da brisa morna.
Vivo cada momento inspirando-me em cada som, em cada odor, em cada toque, em cada olhar…
Sinto-te em cada música que escuto, em cada palavra que redijo, em cada cor eu vejo, em cada pétala que roça a minha pele…
Sigo com estas sensações no encalço da paz que me trouxeste e com a qual me envolvo agora nos lençóis que me esperam nas noites calmas.
Adormeço com a saudade no meu peito e a paz na minha alma…

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Cinzas



Foste rascunho de uma história que vivi num sonho que só a mim pertenceu. O fogo que um dia lhe lançaste queimou-o sem dó e dele apenas restam as cinzas que lentamente o vento vai afastando de mim com a sua aragem suave.
Perdi a razão…
Vesti a pele de menina que já não sou e deixei-me levar por uma quimera onde tu não querias estar.
Promessas não fizeste, mas pairou a esperança… a esperança que um dia te reencontrasses e me encontrasses no teu reencontro.
Vivia numa euforia aguardando escutar a tua voz… Sorria… cantava assim que a ouvia…
Depois passei a viver os meus dias na nostalgia, relembrando os breves momentos que passámos, até me deixares de falar…
A dor foi atroz!…
Como poderias sair assim da minha vida sem sequer dizer adeus? Apenas soou um vago até breve.
Chorei desesperadamente ao acordar do meu sonho, ao ver que afinal não me querias ao teu lado, ao ver que afinal a força da paixão só a mim cabia.
Abandonei-me pelo cansaço. Não podia esperar mais por ti. Soubeste que a minha alma gritava e nunca me secaste as lágrimas que por ti brotavam do meu peito ferido.
Tantas vezes tentei em vão encontrar-te novamente, mas apenas te via nas minhas memórias, no álbum de recordações que agora guardo fechado para não mais me magoar.
Apossou-se de mim um negrume que só a melancolia me trazia, nos dias passados sem ti, onde nem o pôr-do-sol tinha magia, onde só a escuridão e o frio da noite tomavam conta de mim.
Um dia veio o alvorecer e, com ele, a paz e a serenidade regressaram, reinando outra vez no meu coração. Os seus raios espalharam por mim sentimentos de carinho e ternura que estavam adormecidos, passeiam-se por mim com o seu calor e fazem brilhar com novo alento o meu gélido e vago olhar que assim ficou com a desilusão vivida nos meus dias mal amados.
Agora já não escuto com nostalgia as músicas que marcaram os nossos momentos. Essas melodias já não te pertencem. De ti apenas resta a lembrança, mas já não choro.
Ancoro agora num porto que me acolhe, que me dá forças para retomar a minha viagem. As águas começam a aquietar-se. Vislumbro um farol que me guia até nos dias de nevoeiro, mesmo quando as estrelas teimam em não cintilar.
Já despi o vestido de frágil menina. Sou mulher. Fortalecida.
Já não deixo que o frio me gele. Antes procuro o conforto nas palavras ou no silêncio do meigo olhar que me recebeu e aconchegou.
Fecho as janelas do passado e abro a porta do presente, caminhando com brandura ao longo da nova ala que se abriu, plena e cheia de luz.
É lá que me refugio. É lá que começo a escrever uma outra história. É lá que escuto de outra forma as melodias que não mais são tuas e o vento que vai passando de mansinho e purificando a minha alma. É lá que sinto o toque suave do veludo das flores. É lá que vejo as cores que preenchem o meu olhar. É lá que sinto os odores que percorrem os meus sentidos. É lá que me sinto agora feliz, pois sei que as cinzas do meu rascunho permanecem do lado de fora da janela que me obrigaste a fechar e que o vento levanta levemente, apartando-as de mim…