domingo, 30 de março de 2008

Sentimentos




Secam-se-me as lágrimas, porém não se cristalizam os sentimentos. Esses materializam-se a cada dia que se soma aos meus dias passados sem a tua presença.
Rasgam-me os ciúmes quando te vejo brejeiro a falar com outras que nada sabem sobre nós e que sorriem para ti.
São ciúmes que provêm da paixão que sinto e que não posso viver em plenitude.
Duas emoções que tendem a tornar-se mais intensas com o virar da página dos dias intrepidamente sentidos e não rotineiros, numa tentativa vã de ocupar a minha mente noutros lugares que não sejam teus.
Mas todos os gestos, todas as palavras, todos os pensamentos circulam em torno de encruzilhadas que vão encerrar na tua essência e revejo-me num beco sem saída, de onde não quero sair.
Encaro com o teu magnetismo e deixo-me ficar nesse local carregado de sedução, onde recordo os momentos vividos fervorosamente contigo e o meu intento é aí permanecer para sempre, pois só assim sinto que és meu.
Só aí podes ser meu...
Por instantes perco a lucidez, por lastimar os sentimentos que não são meus por direito.
Ardo em ciúmes!
Arrebata-me a paixão!
Abro a janela do devaneio e torno a viver esses momentos passados contigo e o meu corpo estremece ao sentir as tuas mãos passearem na minha pele arrepiada de prazer. Escuto os sons afogados em beijos sedentos de desejo e sinto cada pedaço teu percorrer-me avidamente sem cessar, para depois nos levar ao extremo da volúpia.
Abandono-me a estas sensações no meu leito, naquele onde me deitei para te receber pela primeira vez.
São estas sensações, estas recordações que me acendem e fazem crescer os meus sentimentos, que tu recusas aceitar, porque sempre disseste "Nunca te apaixones..." Tarde demais quando proferiste tais palavras. A paixão já residia em mim...
Chorei dias a fio ao perceber que não a posso viver por inteiro, pois quis o destino que só nos conhecêssemos naquela tarde de Primavera. Desde esse dia foge-me o chão cada vez que te avisto e não concebo a minha existência sem ti.
Serias meu se nos tivéssemos encontrado antes?
Serias meu se não partilhasses o teu leito com outra?
Alguma vez serás apenas meu?
Todas estas perguntas já deambularam enquanto as lágrimas teimavam em cair através do meu rosto que quer sorrir para o mundo, quando a minha alma quer gritar por ti.
Agora acalmei o meu espírito e vivo os momentos que me dás, migalhas do tempo que te vai sobrando e que te vou surripiando muitas vezes de surpresa.
Já não choro...
Secam-se-me as lágrimas, porém não me cristalizam os sentimentos...



segunda-feira, 10 de março de 2008

Ancorada

Vagueio pela penumbra da noite, numa tentativa vã de te encontrar.
Já não sei como te alcançar.
Sinto a tua presença em todas as partes do meu corpo, como se te tivesses cravado em mim.
Todas as melodias me recordam que já te pertenci. Respiro o teu odor, sinto o teu toque, acaricio a tua pele, beijo os teus lábios, aquecem-me os teus beijos ardentes...
Busco-te em todas as horas, sem sucesso. Apenas te encontro na minha memória, cada dia mais distante, porém cada vez mais presente.
Peço às estrelas que me levem na tua direcção, mas elas apenas me levam o pensamento, pois o físico já está ocupado por outra e eu martirizo-me ao imaginar os teus dias com ela. O teu despertar, quando te deitas, quando a ela te entregas...
Como é essa entrega? Em quem pensas nessas horas de prazer?
Fujo desse cenário que me consome e que me rouba a razão.
Escondo-me num lugar que só pode ser ocupado por nós, onde nos podemos refugiar sem que ninguém nos encontre, longe dos olhares mundanos que nos podem incriminar.
Nesse lugar que nos pertence, entrego-me só a ti e prostro-me a teus pés sem reservas nem pudor. Esqueço os mundos separados em que vivemos e devaneio até onde o céu é o limite e onde nos idealizo juntos, tal como nos encontros breves que temos, que quase caem no esquecimento do tempo, mas que jamais se desvanecerão da minha lembrança e engrandecem a minha paixão por ti.
Paixão... Este sentimento que me dá vida em cada instante que passamos juntos, mas que me mata lentamente sempre que não podemos estar.
É um sentimento que me aprisiona quando estou livre, que não me permite sequer conceber a minha existência ao lado de outro homem, pois és só tu quem eu anseio.
Conto os minutos devagar, enquanto a noite se torna mais sombria.
Enrouquece a minha voz interior com as tentativas de te chamar a mim.
Vou obtendo umas ténues visitas, breves momentos que me enchem de esperança e de desejo de me perder nos teus braços outra vez. E outra vez... até que o cansaço nos vença.
No silêncio da noite volto a sentir a tua sombra passear pelo meu corpo e invadir o meu ser, enquanto fecho os olhos languidamente para te voltar a ter.
Torno a olhar para o relógio e continuo a ver o tempo passar serenamente, à espera de te tornar a contemplar, de fitar os teus olhos ávidos e naufragar de novo nesta paixão onde estou ancorada...

segunda-feira, 3 de março de 2008

Terror ressuscitado

Penei esta noite novamente ao reviver o terror em que estive mergulhada nos anos que já passaram e senti-me impotente. Uma fraqueza mórbida alastrou-se por todo o meu corpo e os meus músculos ficaram entorpecidos.
Julgava já ter sepultado esta sensação junto de quem ma provocava.
Esta noite ressuscitou... Ressuscitaram...
Um aperto na barriga, um nó na garganta, apoderaram-se de mim e não articulei uma palavra.
Vi o seu olhar carregado de ódio, de despeito. Da sua boca apenas saía um discurso vil, repleto de injúrias. Dirigia-se-me hostil, proferia calúnias e eu continuava sem articular uma palavra.
O pavor apossou-se de mim e nem sequer me permitiu pensar.
Fiquei-me apenas. Imóvel. Estática.Petrificada.
Abri a janela das recordações e revi os meus dias não vividos, os choros compulsivos, os temores...
Gritos mudos escapavam do meu peito e as lágrimas escorriam no interior da minha alma, manchando a rotina dos meus dias tranquilos.
Estava gélida.
Escapei-me solitária na escuridão e libertei o meu pranto na minha almofada banhada apenas pela minha sombra e, mais uma vez me vi envolvida na solidão que me acompanha.
Pedi que terminasse o sofrimento, mas somente choravam palavras de mágoa e uma dor que me alucinava.
Sinto cansaço, mas o sono teima em chegar. Encolho-me ainda mais no meu leito, tentando sentir o aconchego que desejava que viesse de outros braços que não os meus.
Fluem-me pensamentos abstractos assim que entro na sala do meu passado que mais uma vez me veio assombrar. Fecho os olhos tentando obter a paz que por vezes se desvia do trilho espinhoso que tento esmagar a cada pegada que vou deixando atrás de mim, e que me leva a parte incerta.
Sou perseguida por visões de um passado em que não amei e só queria ser feliz.
Será pecado querer ser feliz?
Porque é atroz o meu sofrimento?
Porque continuam insistentemente a querer ver rolar as lágrimas onde antes se passearam sorrisos de menina?
Lentamente avança a noite, dando lugar à madrugada.
As lágrimas que outrora percorreram a minha face começam a secar e sinto-me adormecer. A dor que me atormentava começa a dissipar-se, ouvindo agora ao longe o eco da questão que se levantou. Quando vai terminar?
Vou cedendo ao embalo que me acarinha e adormeço na esperança de um dia poder viver tranquila e enterrar de vez todos os pesadelos, colocá-los num túmulo bem fundo, para que eles não possam fugir jamais e não me voltem a assombrar as noites em que procuro sossego...